Economia e Finanças
Por Raymundo
Pinto,
É desembargador aposentado do TRT, é escritor,
membro da
Academia de Letras Jurídicas da Bahia e da Academia Feirense de Letras.
Imaginemos um cidadão servidor público graduado, classe média,
casado com mulher que não trabalha e dois filhos adolescentes. Todos da família
alimentam a pose de ricos. Preferem roupas de grife e fazem refeições
frequentes em bons restaurantes. Gostam de viajar juntos, inclusive para o
exterior. A esposa vai a salões de beleza
habitualmente e, consumista nata, adora comprar, em especial coisas supérfluas,
usando o cartão de crédito que o
marido lhe deu. Como não dirige, exige um carro só para si, com motorista. Os
filhos estudam em escolas particulares caras e recebem mesadas generosas. É
claro que manter um estilo de vida desse tipo exige uma elevada renda mensal,
mas vamos admitir que o personagem fictício ora criado não ganha o suficiente
para cobrir as despesas que assume. Resolve, então, na hora que o aperto piora,
tomar o famoso empréstimo consignado. Como este tem limites, entra no cheque especial e, ao mesmo tempo,
paga apenas o mínimo do cartão (juro anual de mais de 300%). No desespero de
uma conta que não fecha, recorre, afinal, a um agiota conhecido.
A descrição do perfil acima deve se aproximar bastante daquele de
algumas pessoas que o leitor conhece. Não é à toa que o Brasil abriga milhões
dos chamados inadimplentes, ou seja, os que gastam acima do que ganham e buscam
suprir os sucessivos déficits com empréstimos bancários ou utilizando outras
formas bem mais onerosas. Assim como os indivíduos, muitos países também
gerenciam com extrema incompetência seu orçamento. A Grécia é o exemplo do
momento. Sua avassaladora crise financeira ocupa as manchetes da imprensa
internacional e, por ser membro do grupo que usa o euro como moeda, a situação
contaminou os demais países europeus, gerando inevitáveis preocupações no mundo
todo. Em estudos antes divulgados na mesma mídia que hoje se espanta com a
crise grega, conceituados economistas demonstraram – com riqueza de dados
irrespondíveis – que, na origem de tudo que acontece, está a forma como vários
dirigentes políticos daquela nação, berço cultural da civilização ocidental, se
comportaram, por longos anos, na desastrada condução dos gastos públicos. Pena
que esquerdistas, alheios aos desmandos praticados, ficam querendo convencer
que a Grécia – coitada! – seria vítima da “burguesia que controla os maiores
grupos financeiros mundiais”...
É evidente que a economia brasileira, apesar da profunda crise
atual, está muito distante de alcançar a vexatória situação vivenciada hoje
pela Grécia. Somos um país de dimensões continentais com imensas riquezas
naturais em grande parte inexploradas. Abrigamos uma população de mais de 200
milhões de habitantes, o que significa um mercado interno bastante atrativo.
Temos moeda própria e uma reserva, em dólares, superior a 300 bilhões. Em suma,
são vários os aspectos positivos que nos fazem acreditar que o Brasil – pelo
menos a médio e longo prazos – “ainda tem jeito”.
A essa altura o leitor já deve estar criticando o título dado a
este artigo. Na verdade, o autor, nesse ponto, cometeu um pequeno exagero,
porém o propósito foi chamar a atenção de que, a exemplo do ocorrido na Grécia,
nossos dirigentes políticos – há um razoável tempo e com mais ênfase nos
últimos 12 anos – estão gerenciando o orçamento nacional de modo claramente
irresponsável. Vamos fazer uma breve demonstração, citando alguns dados
oficiais.
No governo de Fernando Henrique, o Brasil foi abalado pelas crises
provocadas pelo México e pela Rússia. Teve ainda de fazer sacrifícios na
implantação do vitorioso Plano Real, que conseguiu conter, em nível civilizado,
a então disparada inflação. Tais circunstâncias forçaram o país a elevar a
dívida pública para 600 bilhões. Na época, os petistas fizeram severas
críticas. Após chegar ao poder, Lula
proclamou, com alarde, que havia quitado o débito com o FMI. Ele e Dilma,
todavia, sonegaram ao povo a informação de que a dívida, principalmente a
interna, continuou a crescer de modo assustador. Em maio passado, apenas o
débito da União alcançou dois trilhões, quatrocentos e noventa bilhões.
Adicionando-se os dados de estados e municípios, ultrapassa três trilhões. A
população em geral desconhece que, a fim de quitar juros e amortizações desse
altíssimo valor, a nação tem de reservar cerca de 43% das despesas previstas no
seu orçamento anual. Se estiver em pé, leitor, sente-se para ler: o Brasil paga
– em especial aos banqueiros que adquirem títulos da dívida pública – mais de trezentos bilhões anuais para
saldar os referidos juros e amortizações, o que equivale à soma dos orçamentos
de vários ministérios, incluídos os da Educação e da Saúde. Segundo o Banco
Central, a dívida bruta (interna + externa) atingiu, em 2011, o montante de
51,3% do PIB. Com sucessivos aumentos, calcula que chegue a 62,4% no corrente
ano, podendo estourar em 66% em 2016 (ver p. 65 da Veja de 17/6/15).
Note-se que se fala muito em ajuste fiscal, mas quase ninguém
denuncia – nem mesmo a oposição – os escandalosos compromissos do Brasil com a
estratosférica dívida pública e o pagamento dos elevadíssimos juros. Antes de
chegar ao poder, o PT pregava uma auditoria nessas contas e os mais radicais
até preferiam o calote. O silêncio passou a ser a norma atual. Não estamos às
vésperas do caos em que se afundou a Grécia. Contudo, a continuar a
irresponsabilidade no trato dos recursos públicos, as consequências negativas,
nos campos social e econômico, serão incalculáveis, em escala maior –
destaque-se – para os trabalhadores.
Nenhum comentário:
Postar um comentário