A Vermelha, uma viajem pelo passado
A Alhambra ou, preferencialmente, Alambra (em árabe: الحمراء; "a Vermelha") localiza-se na cidade e município de Granada, na província de homônima, comunidade autónoma da Andaluzia, na Espanha, em posição dominante no alto duma elevação arborizada na parte sudeste da cidade.
Trata-se dum rico complexo palaciano e fortaleza (alcazar ou al-Ksar) que alojava o monarca da Dinastia Nasrida e a corte do Reino de Granada. O seu verdadeiro atrativo, como noutras obras muçulmanas da época, são os interiores, cuja decoração está no cume da arte islâmica. Esta importante atração turística espanhola exibe os mais famosos elementos da arquitetura islâmica no país, juntamente com estruturas cristãs do século XVI e intervenções posteriores em edifícios e jardins que marcam a sua imagem tal como pode ser vista na atualidade.
No interior do recinto da Alhambra fica o Palácio de Carlos V, um palácio erguido pelo Imperador Carlos V do Sacro Império Romano Germânico em 1527.
Juntamente com os vizinhos Generalife (uma vila que inclui extensos jardins e hortas) e o bairro do Albaicín, constitui o sítio inscrito na lista de Património Mundial da UNESCO "Alambra, Generalife e Albaicín, Granada".
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A Alambra vista do Mirador de San Nicolás, no bairro de Albaycin. |
O planalto no qual se implanta, com as dimensões de cerca de 740 metros de comprimento por 205 metros de largura máxima, estende-se de oeste-noroeste para este-sudeste, cobrindo uma área de cerca de 142 000 m².
O seu elemento mais ocidental é a alcáçova (cidadela); uma posição fortemente fortificada. O resto do planalto compreende vários palácios, cercados por uma muralha defensiva relativamente fraca, flanqueada por 13 torres, algumas defensivas e outras destinadas a providenciar vistas panorâmicas para os seus habitantes.
O rio Darro corre ao longo duma profunda ravina a norte e divide o planalto do bairro de Albaicín. Do mesmo modo, o vale Assabica, onde está inserido o parque de Alhambra a oeste e a sul, e, por trás deste vale, a quase paralela cadeia do Monte Mauror, separa o complexo do bairro de Antequeruela.
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Vista da Alcáçova para a Sierra Nevada. |
No entanto, esta explicação para o nome da Alhambra é só uma versão, pois há outros autores que defendem que na época andaluz a Alhambra estava caiada e a sua cor era branca. O nome de "vermelha" resultaria do facto de se trabalhar dia e noite durante os anos que durou a sua construção, pelo que o adjetivo relembraria o clarão avermelhado das tochas que iluminavam os trabalhos. Outros autores defendem que "Alhambra" é simplesmente o nome no feminino do seu fundador, Abu Alahmar( Mahomed Ibn-al-Ahmar), que em árabe significa "o Vermelho", por ser ruivo. Outros, ainda, vêm as suas origens na palavra árabe Dar al Amra, que significa Casa do Senhor.
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A Alambra vista dos jardins da Generalife, ao fundo o bairro de Albaicín. |
A primeira referência ao Qal’at al Hamra surge durante as batalhas entre árabes e muladis ocorridas no reinado de Abdalá I de Córdova (888-912). Num confronto particularmente feroz e sangrento, os muladies derrotaram completamente os árabes, os quais foram, então, forçados a refugiar-se num primitivo castelo vermelho na província de Elvira, presentemente localizado em Granada. De acordo com documentos da época que sobreviveram até aos nossos dias, esse castelo era bastante pequeno e as suas muralhas eram incapazes de deter um exército que desejasse conquistá-lo. O castelo foi amplamente ignorado até ao século XI, quando as suas ruínas foram renovadas e reconstruídas por Samuel ibn Naghralla, vizir do Rei Badis ibn Mansur da Dinastia Zirida, numa tentativa de preservar a pequena comunidade judia também localizada na Colina de La Sabika. No entanto, evidências presentes em textos árabes indicam que a fortaleza foi facilmente penetrada e que a Alhambra que sobrevive até à atualidade foi construída durante a Dinastia Nasrida.
Um detalhe dos arabescos
Um detalhe dos arabescos.
Emblema dos Reis Cristãos esculpido depois da conquista.
Moçárabes: detalhe da decoração.
Maomé I, chamado Al-Hamar (o vermelho) por ter a barba ruiva, o fundador da Dinastia Nasrida, foi forçado a fugir para Jaén de forma a evitar a perseguição de Fernando III de Castela e dos seus apoiantes durante a tentativa de libertar a Espanha do domínio mouro. Em 1238, ibn al-Ahmar entra em Granada pela Puerta de Elvira, tendo instalado residência no Palacio del Gallo del Viento, o palácio de Badis. Poucos meses depois, lançou-se na construção duma nova Alhambra preparada para a residência dum rei. De acordo com um manuscrito árabe publicado como o Anónimo de Granada y Copenhague, "Este ano 1238 Abdallah ibn al-Ahmar escalou ao lugar chamado "a Alhambra" inspecionou-o, definiu a fundação dum castelo e deixou alguns encarregados para a sua construção (…)". O desenho incluía planos para seis palácios, cinco dos quais agrupados no quadrante nordeste formando um quarteirão real, duas torres circulares e numerosos banhos. Durante o domínio da Dinastia Nasrida, a Alhambra foi transformada numa cidade palaciana, completada com um sistema de irrigação composto por canais para os jardins da Generalife, uma vila localizada no exterior da fortaleza. Previamente, a velha estrutura da Alhambra estava dependente da água da chuva recolhida para uma cisterna e daquela que podia ser trazida do Albaicín. A criação do Canal do Sultão solidificou a identidade da Alhambra como uma cidade-palácio, em vez duma estrutura defensiva e ascética.
Janela com arabescos.
Porta e arabescos.
O estilo granadino na Alhambra é o culminar da arte andaluza, o que ocorreu em meados do século XIV durante os reinados de Yusuf I (1333-1354) e Maomé V (1354-1391). Os esplêndidos arabescos do interior estão relacionados, entre outros monarcas, com Yusef I (ou Iusuf I), Maomé V, Ismail I, etc.
O domínio muçulmano de Granada chegou ao fim em 1492, quando os nasridas foram derrotados pelo Rei Fernando II de Aragão e pela Rainha Isabel de Castela, os quais tomaram a região envolvente duma forma esmagadora. Depois dessa data, os conquistadores começaram a alterar o complexo arquitetônico, com os Reis Católicos a fazerem da Alhambra um palácio real. Os trabalhos inacabados foram cobertos de cal, apagaram-se as pinturas e dourados, o mobiliário foi destruído ou levado para outros locais. O Conde de Tendilla, da Família de Mendoza, foi o primeiro alcaide cristão da Alhambra. Hernando del Pulgar, cronista da época, conta: O Conde de Tendilla e o Comendador Maior de Leão, Gutierre de Cárdenas, receberam de Fernando o Católico as chaves de Granada, entraram na Alhambra e no alto da Torre de Comares içaram a cruz e a bandeira.
Carlos V (1516–1556) reconstruiu partes do complexo no estilo renascença, contemporâneo, destruindo grande parte do palácio de Inverno para dar espaço a uma estrutura, também em estilo Renascença, que nunca chegou a ser concluída. Filipe V (1700–1746) modificou os quartos para um estilo mais italianizante e completou o seu palacete mesmo no centro do que fora o edifício mourisco. Erigiu determinadas partes que taparam por completo algumas estruturas originais. Em anos subsequentes, sob as autoridades espanholas, a arte islâmica continuou a ser desfigurada. Em 1812, algumas das torres foram demolidas pelos franceses, comandados pelo Conde Sebastiani. O resto do edifício escapou por pouco - aliás, era essa a intenção inicial de Napoleão. Contudo, um soldado incapacitado, querendo frustrar as intenções do seu comandante, desarmou alguns dos explosivos, salvando o que restava de Alhambra para a posteridade.
Em 1821, um sismo causou mais estragos. O trabalho de restauro, começado em 1828, da responsabilidade do arquiteto José Contreras, foi patrocinado em 1830 por Fernando VII. Depois da morte de Contreras, em 1847, foi continuado, com franco sucesso, pelo seu filho Rafael (morreu em 1890), e pelo seu neto Mariano.
O Comité do Património Mundial da UNESCO declarou a Alhambra e o Generalife de Granada como Património Cultural da Humanidade na sua sessão do dia 2 de Novembro de 1984 e, cinco anos depois, o bairro do Albaicín (Al Albayzín), antiga cidade medieval muçulmana, obteve a mesma denominação como extensão da declaração de Património Cultural da Humanidade de La Alhambra e do Generalife. A Alhambra foi um dos 21 candidatos finalistas para a eleição das Novas Sete Maravilhas do Mundo, embora, no final, não tenha conseguido arrebatar o título.
Uma sala da Alambra e uma vista do Pátio dos Leões.
Poetas mouros descrevem a Alambra como "uma perola encastrada em esmeraldas", em alusão à cor dos seus edifícios e à dos bosques que os rodeiam. O complexo do palácio foi desenhado com o lugar montanhoso em mente, tendo sido consideradas muitas formas de tecnologia. O parque (Alameda de la Alambra), o qual fica coberto de flores selvagens e relva durante a Primavera, foi plantado pelos mouros com rosas, laranjeiras e mirtilos; o seu elemento mais característico é, no entanto, o denso bosque de ulmus procera trazido pelo Duque de Wellington em 1812. No parque existem numerosos rouxinóis e é frequente a presença do som da água corrente vindo de várias fontes e cascatas. Estas são abastecidas através dum canal com 8 km. (5 milhas) de comprimento, o qual está ligado com o rio Darro no mosteiro de Jesús del Valle, a montante de Granada.
Uma das portas da Alambra (gravura antiga).
Apesar do longo período em que foi negligenciada, dos vandalismos intencionais e dos restauros por vezes prejudiciais a que a Alambra foi sujeita, permanece como um exemplo atípico da arte muçulmana no seu estádio final na Europa, relativamente independente das influências diretas da arquitetura bizantina encontradas na Mesquita de Córdoba. A maior parte dos edifícios do complexo são de planta quadrangular, com todas as salas a abrir para um pátio central, atingindo o conjunto o seu tamanho atual apenas pela adição gradual de novos quadrângulos, desenhados no mesmo princípio, apesar das dimensões variáveis, e ligados uns aos outros por pequenas salas e passagens. A Alambra foi sendo acrescentada pelos diferentes soberanos muçulmanos que residiram no complexo, no entanto, cada nova secção que foi sendo acrescentada seguia o consistente tema do "Paraíso na Terra". Arcadas colunadas, fontes com água corrente e tanques refletores foram usados para aumentar a complexidade estética e funcional. De qualquer forma, o exterior foi deixado plano e austero. O sol e o vento têm livre admissão. Azul, vermelho e amarelo dourado, todas um pouco desbotadas devido à ação do tempo e do clima, são as cores mais usadas.
A decoração consiste, em regra, de folhagens rígidas e convencionais, inscrições árabes e padrões geométricos trabalhados em arabescos. Azulejos pintados são amplamente usados como painéis para as paredes. O complexo palaciano é desenhado em estilo mudéjar, o qual é característico da reinterpretação das formas islâmicas nos elementos ocidentais e francamente popular durante a Reconquista, um período da história no qual os reis cristãos reconquistaram a Península Ibérica aos muçulmanos.
A Alhambra lembra muitas das fortalezas medievais cristãs na sua organização enquanto castelo, palácio e anexo residencial para os subordinados. A alcáçova, ou cidadela, a sua parte mais antiga, está construída num promontório isolado, o qual termina a plataforma a noroeste, sendo toda constituída por maciças muralhas. Na sua torre do relógio, a Torre de la Vela(25 m. de altura), foi içada pela primeira vez a bandeira de Fernando II de Aragão e Isabel de Castela aquando da conquista espanhola de Granada no dia 2 de janeiro de 1492. Uma torreta contendo um grande sino foi acrescentada no século XIX e restaurada depois de ter sido danificada por um raio em 1881. Para lá da alcáçova fica o palácio dos soberanos mouros, a Alhambra propriamente dita; e para além desta situa-se a Alhambra Alta, originalmente ocupada por oficiais e cortesãos.
Entradas
Uma forma de aceder ao recinto é pela Puerta de las Granadas (subindo desde a Plaza Nueva); outro acesso é pela Cuesta de los Chinos (no final do Paseo de los Tristes):
O caminho central, se subirmos pela Puerta de las Granadas, é destinado aos transportes públicos e chega até ao Palácio de Carlos V. Andando, pode chegar-se até à Puerta de la Justicia (justiça para os casos fáceis - anteriormente a Bab Axarea, a Puerta de la Explanada, na qual nunca se praticou justiça), a qual data da época de Yusuf I, 1348. No centro pode ver-se o relevo duma mão sobre e no segundo arco o relevo duma chave. Esta simbologia tem dado lugar a muitas explicações, ainda que nenhuma definitiva; uma das possibilidades é explicá-la como uma metáfora do conhecimento (a mão deve apanhar a chave que abre a porta do conhecimento).
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A Torre de la Justicia, construída por Yusuf I em 1348, era a entrada original para a Alhambra. |
O Partal
Segue-se uma breve descrição das principais áreas dos palácios que constituem o complexo da Alhambra. O complexo real consiste em três partes principais: o Mexuar, o Seralho e o Harém:
- O Mexuar alojava as áreas funcionais para condução dos negócios e da administração e servia de sala de audiência e justiça para os casos mais importantes. Os tetos, pavimentos e remates são feitos de madeira escura e contrastam de forma flagrante com o branco do estuque das paredes.
- O Seralho, construído durante o reinado de Yusef I, no século XIV, contém o Pátio dos Arrayanes. Os interiores brilhantemente coloridos apresentam painéis, azulejos, tetos decorados e outros trabalhos em madeira.
- Finalmente, o Harém também é decorado de forma elaborada e contém os aposentos de habitação para as esposas e amantes dos monarcas árabes. Esta área contém uma casa de banho com água corrente, quente e fria, além de água pressurizada para chuveiros. As casas de banho estavam abertos para os elementos naturais de forma a permitir a entrada da luz e ar. O Harém também apresenta representações de formas humanas, o que é proibido segundo a lei islâmica. Provavelmente, os artesãos cristãos contratados desenharam obras de arte que seriam colocadas no palácio e os tolerantes monarcas muçulmanos permitiram que os trabalhos ficassem.
Detalhe da parede da Sala Dourada visto de baixo.
O Pátio da Alberca ou dos Arrayanes.
MexuarO Mexuar é a sala mais primitiva e a que apresenta uma decoração mais modesta. Tinha uma câmara elevada fechada por persianas, onde se sentava o sultão a escutar sem ser visto. Não existiam as janelas laterais. Tinha o teto aberto na sua parte central. Ao fundo, existe uma pequena divisão de onde se avista o Albaycín. Na parte superior possui um friso escrito, um oratório. Na continuação, entra-se num pátio com uma fonte ao centro e uma câmara à esquerda.
Pátio do Mexuar ou do Quarto Dourado
Com o beiral original de madeira de cedro, decorado com pinhas e conchas. Debaixo dele, janelas fechadas com persianas. Duas portadas retangulares bordeadas por sanefa de cerâmica. Existem duas portas, uma que conduz ao palácio oficial e outra que não leva a lado nenhum. A que conduz ao palácio é mais simples que a outra, tratada desta forma com o objetivo de confundir os assaltantes e os ladrões. O espaço está decorado com pinturas góticas, além de escudos e emblemas dos Reis Católicos.
Pátio da Alberca (tanque) ou dos Arrayanes (murtas).
Este pátio é o recinto central do Palácio de Comares. Em ambos os lados do tanque, que ocupa grande parte do pátio, encontram-se plantadas murtas. Neste pátio pode encontrar-se um dos temas ambientais da Alhambra: a presença da água; não só atuando como tal, mas também enquanto espelho. Precisamente neste tanque, reflete-se a imponente Torre de Comares. Num dos lados, existe uma galeria a toda a largura do pátio, com alcovas de tertúlia nos seus extremos. Da galeria entra-se na antecâmara chamada de Sala de la Barca (Sala da Barca).
Sala da Barca
A partir da galeria norte do Pátio dos Arrayanes, e através dum arco de moçárabes apontado, acede-se à Sala da Barca, assim chamada uma vez que apresenta um artesanato magnificamente montado em forma de casco de barco. Esta sala, de forma retangular, com 24 metros por 4,35, ao que parece, seria mais pequena inicialmente, sendo a sua ampliação realizada por Mohamed V. Nesta sala existiu uma abóbada semicilíndrica que foi destruída por um incêndio em 1890, sendo substituída por uma reprodução daquela, totalmente temonada em 1964. As paredes apresentam ricos estucados com o escudo nasrida e, dentro dele, a palavra "Bendição" e o lema da dinastia, "Só Deus é vencedor".
A sala encontra-se rodeada por um apainelamento, em cujos extremos se encontram alcovas com rodapés de azulejos que revestem as colunas de suporte a arcos arcos decorados de moçárabes e vieiras.
Daqui acede-se ao Salão de Comares ou Salão dos Embaixadores.
Salão de Comares ou Salão dos Embaixadores
Esta sala é a mais ampla e elevada de todo o palácio, com os seus 11 metros de lado e 18 de altura, contando com muitos espaços abertos. Servia para celebrar as audiências privadas do sultão com outras pessoas, com estas últimas a sentarem-se nas cavidades existentes nas paredes. Para além disso, é aqui que se encontra o trono do sultão.
Apesar de originalmente o pavimento ser de mármore, na actualidade é de barro. No centro da sala pode observar-se um quadrado com o nome de Alá escrito sobre azulejos. É um lugar com um conteúdo poético muito rico, onde podemos encontrar diferentes composições, louvores a Deus e ao emir, e também alguns fragmentos do Corão. Cada centímetro da parede está coberto por algum elemento decorativo. Um dos aspectos mais atraentes do Salão dos Embaixadores é o seu teto, de forma cúbica. Nele estão representados os sete céus da cultura muçulmana, situados uns sobre os outros. O Corão diz que sobre eles está o trono de Deus. Todo o teto está cheio de estrelas, num total de cento e cinco.
O Salão dos Embaixadores encontra-se no interior da Torre de Comares.
Aspecto do Palácio de Comares.
Nas suas partes laterais existem nove alcovas e janelas fechadas antigamente por persianas de madeira e vitrais coloridos chamados de cumarias, (daí o nome de comares). Todas as paredes estão estucadas com motivos de conchas, flores, estrelas e escrituras.
A sala policromada apresenta ouro no relevo, com cores claras no fundo. Rodapé decorado com azulejos. O pavimento original era em cerâmica vidrada em branco e azul com escudos de armas como motivos ornamentais. O teto é uma representação do Universo, quem sabe uma das melhores representações datadas da Idade Média. Realizado em madeira de cedro com incrustações de madeira de diferentes cores, vai formando estrelas sobrepostas que formam diferentes níveis. No nível mais elevado, ao centro, está o Escabelo (عرش) sobre o qual se senta Deus-Alá segundo os relatos corânicos. A partir deste, vão-se repetindo as figuras geométricas que dividem o teto em sete espaços que representam os sete céus que descem consecutivamente até este mundo: o 7 é um dos números simbólicos por excelência.
Entre todos eles aparece o Trono (كرس), que é o símbolo de toda a criação. Este uso simbólico de cosmologia corânica - com tantas alusões ao Escabelo, ao Trono, ao Rei que se senta sobre ele - tem uma clara intenção de legitimar o soberano como representante (jalifa, de onde vem califa) de Deus na Terra. O facto deste salão ser o salão do trono, o qual estava situado no seu centro mesmo debaixo do escabelo divino, é uma clara referência a essa intenção. Porém, a simbologia da sala não acaba aí: as 4 diagonais do Teto de Comares representam os quatro rios do Paraíso e a Árvore do Mundo (o Axis Mundi) que, tendo as suas raízes desde o Escabelo, se expande por todo o Universo. Por outro lado, as alcovas, 9 presentes (três em cada parede), mais três omitidas para deixar passagem para a Sala da Baraca, são uma referência às 12 casas zodiacais, em correspondência com o papel de sétimo céu que ocupa essa altura. Além disso, as paredes estão decoradas com versículos corânicos e poemas realizados em estuque, o que devia conceder a esta sala nas suas origens, com a decoração que não chegou aos nossos dias, com os seus jogos de luz e o seu ambiente cortesão, uma das salas palacianas mais impressionantes do mundo islâmico.
A alcova central estava destinada ao sultão, neste caso Yusuf I, que foi quem construiu o Palácio de Comares. O aquecimento era feito por braseiros e a iluminação por lâmpadas de azeite.
Saindo novamente para o Pátio dos Arrayanes, num dos extremos do pátio, à esquerda, um pequeno arco serve de entrada a passadiço pelo qual se chega à zona privada do monarca, o Harém (Haram significa lugar privado).
Através da Sala dos Moçárabes, chega-se ao Palácio dos Leões.
Sala dos Moçárabes
Esta sala tem este nome devido à abóbada de moçárabes que a cobria originalmente, sendo a atual datada do século XVII. Paredes com trabalhos em estuque, inscrições religiosas e escudo da Dinastia Nasrida. Uma arcada de moçárabes conduz ao Palácio dos Leões.
Vista parcial do Pátio dos Leões.
Este palácio, construído em 1377 por Mohamed V, filho de Yusuf I, apresenta uma planta quadrangular, sendo rodeado por uma esbelta galeria com 124 colunas de mármore branco de Almería. Em redor, as alcovas, salas privadas do sultão e das suas esposas com piso alto aberto, falta de janelas com vistas para o exterior, mas com jardim interior de acordo com a ideia muçulmana do paraíso. O que hoje é terra no pátio, foi jardim. Das salas saem quatro riachos que fluem para o centro: os quatro rios do paraíso. As colunas unem-se com panos perfurados que deixam passar a luz. Fustes cilíndricos muitos delgados, anéis na parte superior, capitéis cúbicos sobre os quais correm inscrições. As placas cinzentas de chumbo convertem os impulsos horizontais em verticais. Os dois pequenos templos que avançam sobre os dois lados opostos do pátio são como que uma lembrança da tenda de campanha dos beduínos. Estas estruturas possuem planta quadrada, sendo decorados com cúpulas de madeira que se apoiam em penachos moçárabes. O beiral é obra do século XIX. Toda a galeria está coberta com cofragem entrelaçada.
A Fonte dos Leões.
Os últimos estudos dizem que os leões procedem da casa do vizir judio Yusuf Ibn Nagrela (1066). Não se sabe se o construiu antes da sua morte, mas foi acusado de querer erguer um palácio mais grandioso que o do próprio rei.
Conserva-se pelo poeta Ibn Gabirol (século XI) uma descrição quase exata da dita fonte.
Representam as 12 tribos de Israel. Dois deles têm um triângulo na frente indicando as duas tribos eleitas: Judá e Levi. São do século XI. A taça tem escritos no seu perímetro versos do ministro e poeta Ibn Zamrak, nos quais se descreve perfeitamente a fonte: "(…)A tão diáfana taça, talhada pérola,/ pelas beiras a gota de orvalho estagnada,/ e vai entre margaridas a prata, /fluida e também feita branca e pura./Tão afim é o duro e o afluente /que é difícil saber qual deles flui(…)".
Atualmente, a fonte encontra-se num processo de restauro, o que obrigou à deslocação dos leões. Esta fonte tem diversos significados e simbologias. Por um lado, os doze leões têm um simbolismo astrológico, aludindo cada leão a um signo zodiacal. Por outro, tem um significado político ou majestático, relacionado com o Rei Salomão (o rei arquiteto), visto que existe uma inscrição na fonte referindo-se a este. Por último, e mais importante, alude a um símbolo paradisíaco, referindo-se à fonte originadora da vida e dos quatro rios do paraíso.
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