Brasil: política
Colaboração
de Fernando Alcoforado*
República é
uma forma de organização do Estado cujo termo vem do latim res publica que
significa "coisa pública", "coisa do povo". Um governo
republicano é aquele que põe ênfase no interesse comum, no interesse da
comunidade, em oposição aos interesses particulares e aos negócios privados. Na
história da República no Brasil desde 1889, quando de sua proclamação através
de um golpe de estado, esses princípios não têm sido respeitados. Os interesses
particulares e os negócios privados têm prevalecido sobre o interesse comum ao
longo da história do Brasil. Esta situação está sendo mais evidenciada
recentemente com os escândalos de corrupção em todas as estruturas do Estado
brasileiro.
O sistema
republicano vigente no Brasil é, na verdade, uma democracia apenas para os
ricos e corruptos. Neste sistema, as eleições são uma farsa porque são
controladas pelos detentores do capital que fazem com que vençam
majoritariamente os candidatos a serviço das grandes empresas como ficou
demonstrado pela Operação Lava Jato. Trata-se de um jogo de cartas marcadas
porque os grupos econômicos nacionais e internacionais impulsionam os grandes
partidos financiando suas eleições milionárias. Empresas e bancos elegem suas
“bancadas” nos diversos níveis do poder legislativo que aprovam leis em favor
dos poderosos na base da compra de votos e dos “lobbies”, e ainda faturam
contratos milionários do Estado. O assalto aos cofres públicos por parte de
políticos e partidos e o aparelhamento da máquina governamental a serviço dos
partidos no poder se tornaram lugares comuns na vida política brasileira.
A corrupção
política faz parte da estrutura do capitalismo moderno, principalmente dos
países periféricos como o Brasil. Não que a corrupção tenha surgido e seja
exclusividade do capitalismo, mas é um coadjuvante importante para a
sustentação deste. Com certeza, para que o capitalismo possa se desenvolver
plenamente precisa mais da corrupção do que da competição no denominado
"livre mercado". Os ladrões de colarinhos brancos são dos mais
diferentes tipos. Alguns são burgueses ou pequeno-burgueses e outros são
oriundos de camadas sociais mais baixas que veem em suas participações nos
governos um meio de aumentarem seus patrimônios pessoais como ficou evidenciado
pela Operação Lava Jato. No Brasil, pouquíssimos são os políticos que são
movidos pelo interesse público. Alguns são discretos e comedidos. Outros
ostentam sem pudor o resultado de seus crimes como demonstram gravações nada
republicanas envolvendo conversas de políticos como Delcídio do Amaral, Lula e,
mais recentemente Romero Jucá, ministro do Planejamento do governo Temer.
No Brasil, o
Estado sempre foi um espaço de manutenção ou de expansão de fortunas de
políticos e seus comparsas. Muitos que ascendem socialmente com a política são
tentados a imitarem os padrões dos ricos se corrompendo como é o caso de ex-sindicalistas
como Lula e Jaques Wagner, que, ao exercerem seus mandatos eleitorais, abdicam
de defender com efetividade os interesses das classes sociais desfavorecidas de
onde são oriundos. A busca da ascensão social os seduz para a roubalheira como
parece comprovar suas condições de investigados pela Operação Lava Jato. Alguns
não enganam a ninguém. Praticamente dizem para o que vieram e porque querem
estar na função pública. Um fato objetivo é que o capitalismo é capaz, em sua
voracidade, de fazer transformar em pó o caráter das pessoas. No Brasil, esta
situação está acontecendo 2 a olhos vistos com a presença no parlamento de 70%
de seus integrantes sendo investigados pelo crime de corrupção.
O
capitalismo, enquanto modo de produção e formação social, sempre viveu esta
contradição, isto é, funciona em bases irracionais na busca incessante do lucro
a qualquer preço, ao tempo em que porta grande possibilidade humana de uso da
razão, jamais conhecida em outros períodos da história graças ao progresso
técnico. Nem mesmo a experiência socialista do século XX na ex- União Soviética
e no leste europeu, que chegou a incorporar um em cada três seres humanos do
planeta Terra, foi capaz de vencer a corrupção que lá se instalou nas altas
esferas do poder dominante até porque a revolução socialista foi traída com a
implantação do capitalismo de estado como ocorre atualmente na China.
Não é
exagero dizer que em todo o universo do capitalismo, os maiores desejos
socialmente compartilhados são os do enriquecimento e consumo. Em todos os
países, a corrupção social (criminalidade, prostituição, etc.) e a estatal
(subornos, desvios de verbas públicas, etc.) crescem exponencialmente. O risco
é que a corrupção atinja níveis elevados chegando a tal ponto, que estas
sociedades nos diversos países percam os seus rumos incentivando a desordem
social. Daí a importância do movimento que já ocorre no Brasil para mobilizar a
população visando desenvolver uma consciência crítica e uma ação que contribuam
para a adoção de formas efetivas de controles sociais, políticos e culturais
sobre o governo em todos os seus níveis.
Muitos
defendem a tese de que existe uma natureza humana maligna geradora da
criminalidade, da violência em geral e da corrupção. Trata-se de uma visão
deturpada da realidade. O homem é produto das condições sociais em que vive. É
falsa a afirmativa de que a corrupção seja parte da natureza humana e de que,
por isso, é impossível de ser detida. O capitalismo é que contribui para sua
emergência. No mundo dos homens e das mulheres há bastante espaço para se optar
por caminhos diferentes. Para que isto aconteça, a Sociedade Civil de cada país
tem que atuar para mudar a realidade em que nós vivemos no Brasil e no mundo.
A gravidade
da situação política atual do Brasil está a exigir a refundação da República
que é, no momento, uma mera peça de ficção. A crise política que abala o Brasil
resulta, fundamentalmente, da falência do modelo político aprovado na Constituinte
de 1988. A falência do modelo político do Brasil está configurada no fato do
presidencialismo em vigor desde 1889 ser gerador de crises políticas e
institucionais como as que já ocorreram no passado que resultaram em
impeachments e golpes de estado. Além disso, o sistema político do País está
contaminado pela corrupção como comprovam os processos do “mensalão” e da
Operação Lava Jato. A democracia representativa no Brasil manifesta, também,
sinais claros de esgotamento ao desestimular a participação popular nas
decisões do governo, reduzindo a atividade política a meros processos
eleitorais que se repetem periodicamente em que o povo elege seus
representantes os quais, com poucas exceções, após as eleições passam a
defender interesses de grupos econômicos em contraposição aos interesses
daqueles que os elegeram.
A crise
ética e moral se manifesta em todas as instâncias do governo que é evidenciada
pelos sucessivos escândalos de corrupção que ocorre a cada dia que se passa e
que se tornou endêmica em todo o País. O Brasil enfrenta um processo de
descalabro ético e moral no plano político-institucional nunca visto na
história do País. Para reestruturar o 3 sistema político e econômico do Brasil,
é preciso que haja a imediata convocação de uma nova Assembleia Nacional
Constituinte para reordenar a vida política e econômica nacional em novas bases
com a substituição do modelo neoliberal, que torna o Brasil dependente do
capital financeiro nacional e internacional e infelicita a nação desde 1990,
pelo modelo nacional desenvolvimentista que faria com que o País assumisse as
rédeas de seu destino. Esta situação só chegará ao fim com a existência no
Brasil de um governo que seja capaz de unir a nação em torno de um projeto
comum de desenvolvimento econômico, político e social e tenha gente competente
no comando da nação.
A Assembleia
Constituinte Exclusiva a ser convocada para reordenar a vida nacional teria por
objetivo: 1) realizar a reforma do sistema político do País com a
institucionalização do voto distrital e a redução do número de parlamentares e
de suas mordomias nos parlamentos federal, estadual e municipal, entre outras
medidas; 2) promover a reforma do Estado e da Administração Pública em novas
bases; 3) banir partidos políticos e parlamentares comprometidos com a
corrupção; 4) Formar novos partidos políticos após a nova Constituinte; e, 5)
convocar novas eleições gerais no País, entre outras medidas. A Assembleia
Constituinte Exclusiva a ser convocada deveria instituir, também, o
parlamentarismo e decidir pelo fim do Senado Federal com a institucionalização
do sistema unicameral.
*Fernando Alcoforado, 76, membro da Academia Baiana de
Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento
Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor
nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento
regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros
Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a
Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o
Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento
do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de
Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e
Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do
Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA,
Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social
Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento
Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010),
Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento
global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os
Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV,
Curitiba, 2012) e Energia no Mundo e no BrasilEnergia e Mudança Climática
Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015). Possui blog na
Internet (http://fernando.alcoforado.zip.net). E-mail: falcoforado@uol.com.br
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