segunda-feira, 10 de outubro de 2016

BAILADOS CÓSMICOS FOTOGRAFADOS PELO HUBBLE

 Astronomia


Publicado por João Pedro Lobato



A colisão entre galáxias é um dos fenômenos mais espetaculares da natureza, mas até os vermos em toda a sua força e beleza foi preciso esperar pelas fotografias do Telescópio Espacial Hubble. Pelos vistos, o Universo é como um enorme salão de dança, onde algumas galáxias se divertem num demorado bailado cósmico.




Galáxias NGC 2207 and IC 2163 © NASA, ESA, and The Hubble Heritage Team (STScI)
As estimativas dos astrónomos apontam para entre 50 a 100 mil milhões o número de galáxias que estão espalhadas pelo nosso Universo. A Via Láctea é uma delas e contém cerca de 200 mil milhões de estrelas, mas existem muitas mais que são diferentes, quer mais pequenas, quer maiores, em espiral (como é o caso da nossa), elípticas ou irregulares. É ao gosto do freguês.
Tal como os humanos, as galáxias também mudam ao longo do seu ciclo de vida, muito devido à interação que estabelecem entre si - patrocinada pela força da gravidade. Sendo assim, as colisões entre galáxias constituem fenómenos bastante comuns e ao mesmo tempo fantásticos, com as maiores a engolirem as mais pequenas até se fundirem numa só. Um testemunho deste "canibalismo galáctico" encontra-se nas imagens que o Telescópio Espacial Hubble (lançado para a órbita terrestre em 1990) continua a enviar-nos. Contudo, mais do que imagens de horror, o que vemos são deslumbrantes bailados e rodopios intensos que nos deixam boquiabertos perante as maravilhas que o Cosmos alberga.

Galáxias M51 e NGC 5195 © NASA, ESA, S. Beckwith (STScI), and The Hubble Heritage Team (STScI/AURA)
A galáxia espiral M51, também conhecida como galáxia "redemoinho", é uma das meninas queridas dos astrónomos, e as imagens que o Hubble captou deixam perceber a razão do porquê. O seu aspecto majestoso e rico em pormenores tem o poder de nos tirar o fôlego, com um par de braços rodopiantes que brilham no escuro, ora em tons de azul, ora em rosa, como se fizessem parte de um sonho psicodélico. Só que o M51 é bem real, embora estejamos a olhar para um objeto cósmico que está a 31 milhões de anos-luz da Terra, o que em quilómetros redunda num número começado por 293... seguido de mais 18 dígitos. Todavia, não deixa de ser uma distância bastante curta, tendo em conta as enormes potencialidades do Hubble.
No centro desta galáxia, a amarelo, resguardam-se as estrelas mais velhas, e a girar em seu redor temos as jovens estrelas (a azul) acompanhados de uns quantos "bebés" bem grandes, ou seja, sóis que ainda estão em processo de formação. Aliás, o segredo da M51 está nas suas espirais, as quais se comportam como autênticas fábricas, pois permitem comprimir as nuvens de gás hidrogénio e criar fornadas de novas estrelas.
Contudo, um dos elementos fulcrais em toda a trama esconde-se no lado direito da imagem. Eis a galáxia NGC 5195, o pequeno "borrão" amarelo responsável por enviar ondas gravitacionais em direção à sua grande vizinha, o que faz com que os seus tentáculos se apertem e propiciem a formação de mais estrelas. Entretanto, alguns astrónomos culpam a NGC 5195 pela proeminência dos braços da M51, e à primeira vista parece que o"pequenote" está mesmo a arrancar um dos membros ao "matulão". Mas as aparências iludem, pois a diminuta galáxia está apenas a deslizar, suavemente, pela sua companheira, num ato de carícia que tem demorado centenas de milhões de anos, pois no Universo tudo leva o seu (longo) tempo.

Galáxias NGC 4038 e NGC 4039 © NASA, ESA, and the Hubble Heritage Team (STScI/AURA)-ESA/Hubble Collaboration
O duo que se segue (a NGC 4038 e a NGC 4039) só entrou nestas andanças dos bailados cósmicos há algumas centenas de milhões de anos, quando a atração gravitacional começou a aproximá-las e as obrigou a interagir. Para além de parecerem irremediavelmente emaranhadas uma na outra, distinguem-se por serem as galáxias, em rota de colisão, que mais perto de nós se encontram (45 milhões de anos-luz), sendo igualmente o par mais novo, nestas condições, de que há registo.
Do abalroamento que está em curso irão nascer milhares de milhões de estrelas, com as regiões mais brilhantes e compactas a gerarem super-enxames de estrelas luminosas. Eis, portanto, uma das maiores "maternidades" do Cosmos.

Colisão galáctica Arp 272 © NASA, ESA, the Hubble Heritage (STScI/AURA)-ESA/Hubble Collaboration, and K. Noll (STScI)
O poder de visão do Hubble é sem dúvida admirável. A 450 milhões de anos-luz de distância (e aqui deixa de fazer sentido qualquer cálculo em quilómetros), encontramos uma das colisões galácticas mais peculiares do Universo. Os astrónomos deram-lhe o nome de Arp 272 e representa duas galáxias num enorme e enrolado abraço.

Galáxia NGC 3256 © NASA, ESA, the Hubble Heritage (STScI/AURA)-ESA/Hubble Collaboration, and A. Evans (University of Virginia, Charlottesville/NRAO/Stony Brook University)
Para os mais nostálgicos existem também as galáxias que, atualmente, mais não são do que relíquias dos choques de titãs que ocorreram no passado. A galáxia NGC 3256 é um desses exemplos, possuindo duas extensas e luminosas caudas, para além de dois núcleos no seu centro, que servem de testemunho à fusão que sobreveio.

Par galáctico em interação ESO 69-6 © NASA, ESA, the Hubble Heritage (STScI/AURA)-ESA/Hubble Collaboration, and A. Evans (University of Virginia, Charlottesville/NRAO/Stony Brook University)
Uma pauta colossal, onde sobressaem duas singelas notas musicais. As semelhanças são inconfundíveis assim que colocamos os olhos em cima da ESO 69-6 (que engloba um par de galáxias em interação). As enormes caudas que se esticam são o indício inconfundível de que a força da gravidade está aqui a fazer "das suas", tendo despido as duas galáxias, que estão na imagem, do gás e estrelas que as compunham.

Par galáctico em interação ARP 240 © NASA, ESA, the Hubble Heritage (STScI/AURA)-ESA/Hubble Collaboration, and A. Evans (University of Virginia, Charlottesville/NRAO/Stony Brook University)
Um par de dançarinos, de mãos dadas, a elaborar uma difícil pirueta. Eis o duo galáctico Arp 240, ambos em forma de espiral e com a mesma massa e tamanho, como se fossem gémeos separados que estão destinados a unir-se. Todavia, um terrível segredo esconde-se nas suas entranhas: cada um deles carrega no seu ventre um buraco negro supermassivo. Eis uma dança perigosa, mas que felizmente prefere desfilar-se em palcos muito distantes, a 300 milhões de anos-luz dos terráqueos.



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