Ciência
Melissa
Hogenboom
Da BBC Earth
Darwin com o filho William, em 1842
Quando William Erasmus Darwin nasceu, em
dezembro de 1839, seu pai, Charles, começou a registrar observações sobre o
bebê meticulosamente em um caderno.
Guardado
atualmente na Biblioteca da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, o
registro parece muito mais um documento de pesquisa do que um diário escrito
por um pai sobre o comportamento de seu primogênito.
Algo
que é bem expressado por comentários como este:
“Durante
a primeira semana, bocejou e alongou com uma pessoa velha – em especial os
membros superiores. Soluçou, espirrou, sugou...”
Sabemos
muito sobre as teorias do naturalista britânico, mas pouco sobre como sua vida
privada contribuiu para seu trabalho. Uma vasta coleção de cartas e o caderno,
porém, revelam um lado intrigante do pai da evolução: Darwin como um homem de
família.
Orangotango
O
desenvolvimento de seus filhos colaborou para sua compreensão da evolução
humana.
William
nasceu um ano depois de o cientista ter encontrado pela primeira vez Jenny, o
primeiro orangotango do Zoológico de Londres.
“Para
Darwin, o orangotango era como uma janela para as origens da humanidade”, diz
John van Wyhe, da Universidade Nacional de Cingapura, diretor do projeto Darwin
Online, uma coleção de todos o trabalho publicado pelo cientista.
Bebês e orangotangos têm comportamentos
parecidos
Naquela
época, Darwin já estava formulando ideias sobre a origem dos humanos, mas nunca
tinha tido contato com um de nossos mais próximos parentes primatas para testar
suas teorias. Seu encontro com Jenny cimentou a ideia de que nós e os macacos
tínhamos um ancestral em comum.
“Ver
as expressões faciais de Jenny e seu comportamento social reafirmou suas ideias
sobre um relacionamento entre humanos e primatas”, explica Wyhe.
Darwin
percebeu principalmente como o comportamento do orangotango era parecido com o
de um humano, algo que ele escreveu em uma carta para sua irmã Susan.
“O
tratador mostrou uma maçã a Jenny, mas não a deu para ela. Isso fez com que ela
se jogasse no chão, chorando e esperneando, exatamente como um criança fazendo
pirraça.”
Quando
seu filho nasceu, logo depois, ele pôde acompanhar de perto como uma criança se
desenvolvia e considerar o relacionamento entre homens e animais.
Muitos
pais fazem anotações sobre seus filhos, mas nada assim, explica Alison Pearn, do
projeto Correspondências de Darwin, da Universidade de Cambridge. “Eram como
notas de pesquisa.”
Jenny foi o primeiro orangotango do zoológico
de Londres
“O
caderno oferece um retrato íntimo de Darwin: um bem humorado e curioso pai que
cutuca seu bebê como se fosse um macaco”, diz Van Nyhe.
As informações iniciais sobre sua família e o
orangotango influenciaram os livros A Origem do Homem e a Seleção
Sexual e A Expressão das Emoções nos Homens e nos Animais,
publicados respectivamente em 1871 e 1872.
Em
suas notas, Darwin conta como fez experiências com sons que amedrontavam seu
filho.
Na obra A Expressão das Emoções...,
ele contou como humanos reagem imediatamente ao barulho. Testou suas ideias em
suas crianças, sacudindo uma caixa na frente delas. “Comecei a expor meus
filhos a ruídos súbitos quando tinham menos de duas semanas.”
Darwin
também considerou emoções felizes. Notou quando William sorriu pela primeira
vez, por exemplo. Mas também comparou o sorriso dele ao dos orangotangos.
Orangotangos sorriem como humanos
Felizmente,
sua mulher, Emma, sabia no que estava se metendo. Inclusive que poderia se
transformar em um objeto de suas observações científicas, o que acabou
acontecendo antes mesmo de eles se casarem.
Mais
tarde, as crianças de Darwin deixaram de ser objeto de estudo para se tornarem
ajudantes. A Universidade de Cambridge adquiriu recentemente um lote de 112
cartas desconhecidas de dois de seus filhos, William e Henrietta. Elas ajudam a
revelar como as crianças se envolveram nas pesquisas – mostram, por exemplo,
discussões sobre ideias e observações.
“Sempre
pensamos que ele era um pouco isolado”, conta Pearn sobre o filho mais velho.
Henrietta teve um papel ainda mais importante: o de
editora. Darwin chegou a pedir que a filha fizesse a revisão de A Origem do Homem... durante uma viagem de férias
à Europa.
Mas
nem tudo era trabalho na casa o cientista. De origem rica, ele fez suas
pesquisas como voluntário e nunca foi pago por elas. A família também pareceu
se divertir, segundo Pearn. “Era uma vida familiar invejável. A ciência estava
em todo o lugar.”
Eles
tinham criações de galos, pombos e coelhos. Plantas exóticas estavam em
despensas e janelas – algumas delas carnívoras. Darwin experimentava dar aos
filhos vários tipos de alimentos.
Os diários de Darwin sobre as atividades do
filho William
As
conclusões dele permeiam a sociedade até hoje. E o número de ideias geniais que
teve é menos surpreendente se considerarmos que ele passava o tempo todo
observando o mundo a seu redor.
Darwin
começou a publicar suas ideias há 150 anos, e suas observações eram
estranhamente precisas. Isso apesar da ausência, à época, de fósseis de
antepassados humanos.
Tudo
o que Darwin tinha eram nossos parentes mais próximos vivos, os macacos. Eles
revelaram que as diferenças entre humanos e animais estavam diminuindo.
Assim
como escreveu Darwin, diferimos em grau, não em espécie, de outros tipos de
primatas.
Essas
observações deram início ao que agora se transformou em um campo de estudo:
primatologistas analisam nossos parentes para entender mais sobre a humanidade.
E
também temos que agradecer a seus filhos por isso.
Leia a versão original dessa
reportagem (em inglês) no site BBC Earth
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