sábado, 30 de abril de 2016

COMO OBSERVAR OS FILHOS AJUDOU DARWIN A COMPREENDER A EVOLUÇÃO HUMANA



Ciência
 
Melissa Hogenboom
Da BBC Earth





Darwin com o filho William, em 1842

Quando William Erasmus Darwin nasceu, em dezembro de 1839, seu pai, Charles, começou a registrar observações sobre o bebê meticulosamente em um caderno.


Guardado atualmente na Biblioteca da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, o registro parece muito mais um documento de pesquisa do que um diário escrito por um pai sobre o comportamento de seu primogênito.
Algo que é bem expressado por comentários como este:
“Durante a primeira semana, bocejou e alongou com uma pessoa velha – em especial os membros superiores. Soluçou, espirrou, sugou...”
Sabemos muito sobre as teorias do naturalista britânico, mas pouco sobre como sua vida privada contribuiu para seu trabalho. Uma vasta coleção de cartas e o caderno, porém, revelam um lado intrigante do pai da evolução: Darwin como um homem de família.
Orangotango
O desenvolvimento de seus filhos colaborou para sua compreensão da evolução humana.
William nasceu um ano depois de o cientista ter encontrado pela primeira vez Jenny, o primeiro orangotango do Zoológico de Londres.
“Para Darwin, o orangotango era como uma janela para as origens da humanidade”, diz John van Wyhe, da Universidade Nacional de Cingapura, diretor do projeto Darwin Online, uma coleção de todos o trabalho publicado pelo cientista.

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 Bebês e orangotangos têm comportamentos parecidos
 
Naquela época, Darwin já estava formulando ideias sobre a origem dos humanos, mas nunca tinha tido contato com um de nossos mais próximos parentes primatas para testar suas teorias. Seu encontro com Jenny cimentou a ideia de que nós e os macacos tínhamos um ancestral em comum.
“Ver as expressões faciais de Jenny e seu comportamento social reafirmou suas ideias sobre um relacionamento entre humanos e primatas”, explica Wyhe.
Darwin percebeu principalmente como o comportamento do orangotango era parecido com o de um humano, algo que ele escreveu em uma carta para sua irmã Susan.
“O tratador mostrou uma maçã a Jenny, mas não a deu para ela. Isso fez com que ela se jogasse no chão, chorando e esperneando, exatamente como um criança fazendo pirraça.”
Quando seu filho nasceu, logo depois, ele pôde acompanhar de perto como uma criança se desenvolvia e considerar o relacionamento entre homens e animais.
Muitos pais fazem anotações sobre seus filhos, mas nada assim, explica Alison Pearn, do projeto Correspondências de Darwin, da Universidade de Cambridge. “Eram como notas de pesquisa.”


Jenny foi o primeiro orangotango do zoológico de Londres

“O caderno oferece um retrato íntimo de Darwin: um bem humorado e curioso pai que cutuca seu bebê como se fosse um macaco”, diz Van Nyhe.

As informações iniciais sobre sua família e o orangotango influenciaram os livros A Origem do Homem e a Seleção Sexual e A Expressão das Emoções nos Homens e nos Animais, publicados respectivamente em 1871 e 1872.
Em suas notas, Darwin conta como fez experiências com sons que amedrontavam seu filho.
Na obra A Expressão das Emoções..., ele contou como humanos reagem imediatamente ao barulho. Testou suas ideias em suas crianças, sacudindo uma caixa na frente delas. “Comecei a expor meus filhos a ruídos súbitos quando tinham menos de duas semanas.”
Darwin também considerou emoções felizes. Notou quando William sorriu pela primeira vez, por exemplo. Mas também comparou o sorriso dele ao dos orangotangos.


Orangotangos sorriem como humanos

Felizmente, sua mulher, Emma, sabia no que estava se metendo. Inclusive que poderia se transformar em um objeto de suas observações científicas, o que acabou acontecendo antes mesmo de eles se casarem.
Mais tarde, as crianças de Darwin deixaram de ser objeto de estudo para se tornarem ajudantes. A Universidade de Cambridge adquiriu recentemente um lote de 112 cartas desconhecidas de dois de seus filhos, William e Henrietta. Elas ajudam a revelar como as crianças se envolveram nas pesquisas – mostram, por exemplo, discussões sobre ideias e observações.
“Sempre pensamos que ele era um pouco isolado”, conta Pearn sobre o filho mais velho.
Henrietta teve um papel ainda mais importante: o de editora. Darwin chegou a pedir que a filha fizesse a revisão de A Origem do Homem... durante uma viagem de férias à Europa.
Mas nem tudo era trabalho na casa o cientista. De origem rica, ele fez suas pesquisas como voluntário e nunca foi pago por elas. A família também pareceu se divertir, segundo Pearn. “Era uma vida familiar invejável. A ciência estava em todo o lugar.”
Eles tinham criações de galos, pombos e coelhos. Plantas exóticas estavam em despensas e janelas – algumas delas carnívoras. Darwin experimentava dar aos filhos vários tipos de alimentos.


Os diários de Darwin sobre as atividades do filho William

As conclusões dele permeiam a sociedade até hoje. E o número de ideias geniais que teve é menos surpreendente se considerarmos que ele passava o tempo todo observando o mundo a seu redor.
Darwin começou a publicar suas ideias há 150 anos, e suas observações eram estranhamente precisas. Isso apesar da ausência, à época, de fósseis de antepassados humanos.
Tudo o que Darwin tinha eram nossos parentes mais próximos vivos, os macacos. Eles revelaram que as diferenças entre humanos e animais estavam diminuindo.
Assim como escreveu Darwin, diferimos em grau, não em espécie, de outros tipos de primatas.
Essas observações deram início ao que agora se transformou em um campo de estudo: primatologistas analisam nossos parentes para entender mais sobre a humanidade.
E também temos que agradecer a seus filhos por isso.

Leia a versão original dessa reportagem (em inglês) no site BBC Earth




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